agosto 19, 2009

parte 4

(4) Torna-se, portanto, imperativo abandonar a afirmação de que a filosofia é destituída de valor, mesmo com respeito à riqueza material. Uma boa filosofia, ao influenciar favoravelmente a política, pode gerar uma prosperidade incapaz de ser alcançada sob a égide de uma filosofia inferior. Outrossim, o expressivo desenvolvimento da ciência, com seus conseqüentes benefícios de ordem prática, muito depende de seu background filosófico. Houve mesmo quem tenha chegado a afirmar, a nosso ver exageradamente, que o desenvolvimento da civilização como um todo seria concomitante às mudanças na idéia de causalidade, da concepção mágica de causalidade à científica. De qualquer modo, a idéia de causalidade faz parte do objeto da filosofia. A própria ‘perspectiva científica’, em grande parte, foi introduzida inicialmente pelos filósofos.

(5) Todavia, certamente não estaremos nas melhores condições para fazer um estudo proveitoso da filosofia se a encararmos principalmente como uma via indireta de acesso à riqueza material. A principal contribuição da filosofia consiste no intangível background intelectual do qual muito dependem o clima espiritual e a feição geral de uma civilização. Nesse sentido, ocasionalmente se desenvolvem ambições ainda maiores. Whitehead, um dos mais expressivos e acatados pensadores modernos, descreve os dons da filosofia como "a capacidade de ver e de prever, aliada a um sentido do valor da vida, ou seja, o sentido da importância que anima todo esforço civilizado".1 Acrescenta ainda Whitehead que, "quando uma civilização atinge seu auge sem coordená-lo com uma filosofia de vida, difundem-se por toda a comunidade períodos de decadência e monotonia, seguidos pela estagnação de todos os esforços". Para ele, a filosofia consiste em "uma tentativa de esclarecer as crenças que, em última instância, determinam nossa atenção, a qual integra a base de nosso caráter".

De um modo ou de outro, podemos ter como certo que o caráter de uma civilização é enormemente influenciado por sua concepção geral da vida e da realidade. Até pouco tempo, para a maioria das pessoas, essa concepção era proporcionada pelo ensino religioso, mas as próprias concepções religiosas foram muito influenciadas pelo pensamento filosófico. Ademais, a experiência demonstra que as concepções religiosas podem conduzir-nos à loucura, a menos que sejam continuamente submetidas a uma avaliação racional. Os que rejeitam qualquer concepção religiosa devem ter o maior interesse em elaborar uma nova concepção para, se possível, substituir a crença religiosa. E fazê-lo significa engajar-se na filosofia.

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